13/05/2008

CORAGEM!

Já passaram 11 anos, mas tudo o que senti naquele dia permanece em mim como se fosse hoje...

Lembro-me perfeitamente de como ele olhava para mim, mesmo antes da morte dos meus pais naquele acidente de viação, onde eu fui a única sobrevivente... Sinceramente, naquela altura, apesar de ter perdido as pessoas mais importantes da minha vida, considerava-me uma sortuda. Foi mesmo um milagre ter sobrevivido e ainda por cima sem grandes fracturas nem graves ferimentos. Mas hoje não sei se foi sorte ou só a pior coisa que me poderia ter acontecido...
Tinha 9 anos quando a segurança social me entregou aos meus tios. Eles encontravam-se numa péssima fase da relação, pois todas as noites, ouvia a minha tia a suplicar-lhe que parasse de bater nela. Ele, desempregado e viciado em álcool, quando chegava de madrugada, espancava a minha tia da pior maneira possível e feria-a verbalmente com insultos nojentos e impetuosos.

De manhã, enquanto me preparava para a escola, via-a a tentar esconder as nódoas negras que se encontravam por todo o seu corpo. Ela, sempre com um sorriso dava-me os bons dias, um beijo terno na testa, preparava me o pequeno-almoço e vestia-se para me por na escola.
Lá, ficava o dia todo a pensar no que se passava em casa principalmente, na forma como sempre ele olhara para mim. Depois quando voltava para casa, encontrava-a sempre vazia porque ele, estava no sítio habitual a beber e a minha tia ainda se encontrava a trabalhar. Ficava assim durante 4 horas, a escutar o murmúrio das paredes silenciosas ao mesmo tempo que as súplicas da minha tia se imortalizavam no meu pensamento. Era assim o meu dia a dia após a morte dos meus pais, até que um dia... Sim esse dia mudou a minha vida por completo...Ainda me lembro do que trazia vestido, de como tinha o cabelo, dos sapatos que trazia, do cheiro da casa, de como as janelas se encontravam sujas, do calor horripilante que me atormentava, do seu respirar ofegante que me incomodava tão perto da minha face, de quantas lágrimas deslizaram pelo meu rosto e até me lembro da estranha sensação de fraqueza e repugnância que sentia...

Entrei em casa à hora do costume pensando encontrar as paredes silenciosas a murmurar. No entanto, em vez disso, vi-o bêbado encostado na parede do corredor. Fitou-me de uma forma estranha, sorriu maliciosamente e num tom sinistro chamou-me. Eu balbucio um “boa tarde” e corro para o quarto atemorizada. Fecho a porta e pressiono-a, pois não tinha a chave para tranca-la. Ao escutar os seus passos apercebo-me de que se aproximava da minha porta. A maçaneta move-se e a porta é empurrada, o meu corpo frágil e delicado deixa-se ser empurrado e a porta abre-se.
Assustada dou dois a três passos para trás, ele num esticar de braço agarra-me com força, puxa-me para a cama e... e a partir desse dia deixei de ser a mesma...

Ainda hoje sinto a sua saliva a percorrer-me o pescoço, os seus dedos sujos a passarem pelo meu corpo e pela zona mais íntima dele, ainda sinto a sua língua tentando penetrar a minha boca e o seu suor a pingar sobre o meu rosto...Foram 2 anos a viver esse pesadelo, pois sofria em silêncio com as paredes e todos os dias tinha que aguentar com aquele corpo pesado e sebento debruçado sobre o meu.

Nunca contei isto a ninguém, mas conto-o hoje porque sei que poderá abrir os olhos a muita gente.

Conto-o para que salvem crianças que sofrem com a monstruosidade dos adultos...

BASTA UM TELEFONEMA...

"Amo-te só no meu silêncio, num só pedacinho de mim..."

Não percebo nem metade das coisas que ele diz ou do que ele faz, mas percebo o que ele sente porque, apesar dos seus lábios ficarem completamente apáticos no ponto alto do momento, os seus olhos não mentem. Mas "ela" não percebe ou, simplesmente não quer perceber...


Por vários instantes observei todo o teu ser, memorizando a tua inteira perfeição no mais amplo desejo de te ter. Observei meticulosamente o teu bocejar, o teu dom de sorrir verdadeiramente, o teu mais expressivo olhar, as flutuações de palavras proferidas, o franzir da tua testa de cada vez arregalavas os olhos, o esticar do teu queixo quando por mero acaso fazias aquela coisa estranha com a tua deliciosa boca, a tua fraqueza nos momentos em que estavas com “ela”…

Fazias-me voar em pensamento, fazias-me sentir um turbilhão de emoções inesperadamente desesperantes cujo sabor era delicadamente benigno de sentir e saciava os meus maiores anseios. Eu adorava sentir o que sentia porque bem lá no meu fundo, sabia que era só isso que poderia ter de ti, e a mim só me bastava saber que eras tu que me fazias sentir aquilo e tudo estava bem… Tudo estava mesmo bem…

Daria tudo para ser “ela”, para te poder abraçar e amar-te uma só vez da forma como intento… Queria poder estar no teu pensamento, dentro dos teus sonhos e no teu olhar, mas só te posso amar no meu silêncio, num só pedacinho de mim…